Bromélias

Foto: José Eduardo Figueiredo Dornelles

Bromélias

Fernanda Bered

Eliane Kaltchuk dos Santos

Clarisse Palma da Silva

Gecele Matos Paggi

Há muito tempo, as bromélias vêm sendo utilizadas pelos povos nativos das Américas, estando fortemente presente em suas culturas. Atualmente, mais de 90 espécies são utilizadas no mundo todo para diversos fins, tais como: para produção de fibras, forragem, na alimentação humana, em rituais místicos, para a produção de combustíveis, na ornamentação, entre outros (BENNET et al., 2002). Entre essas categorias de usos, podemos destacar a importância das bromélias como plantas ornamentais de grande valor comercial, como fonte de alimento para o homem e pelas suas propriedades medicinais. Nessas categorias, os gêneros mais utilizados são: Aechmea, Alcantharea, Ananas, Bromelia, Billbergia, Catopsis, Guzmania, Neoregelia, Nidularium, Pitcairnia, Pseudoananas, Puya, Tillandsia e Vriesea.

O abacaxi, Ananas comosus (L.) Merr., é uma das frutas tropicais mais amplamente cultivadas no mundo. Além de ser muito apreciado pelo seu sabor, o abacaxi possui propriedades medicinais em virtude da presença da bromelina, uma enzima com propriedades proteolíticas semelhantes à papaína. Atualmente, a bromelina é utilizada em medicamentos com ação anti-inflamatória e analgésica (BENNETT, 2000).

Bromeliaceae é a maior família de plantas típicas do Novo Mundo. A distribuição geográfica apresenta como limite norte de ocorrência os estados da Virgínia, Texas e Califórnia, nos Estados Unidos (latitude 37°N), e como limite sul, o norte da Patagônia, na Argentina (latitude 44°S). A única exceção é Pitcairnia feliciana (A. Chev.) Harms e Mildbr., que está localizada no oeste da África, na região da Guiné (POREMBSKY; BARTHLOTT, 1999). Possivelmente, a origem e a dispersão das primeiras espécies tenham ocorrido em época próxima à separação do supercontinente Gondwana, o que explicaria a presença de uma espécie primitiva remanescente na África. Ainda que evidências, como características do pólen e macrofósseis, indiquem que Liliopsida (classe na qual as bromélias estão inseridas) tenha evoluído no meio do Cretáceo, presume-se que as bromélias tenham surgido a partir da metade do Terciário – entre 40 e 65 milhões de anos atrás (BENZING, 2000). Provavelmente o surgimento da família é fenômeno relativamente recente, que deve ter ocorrido no próprio Novo Mundo, como sugere sua distribuição continental restrita (SMITH, 1934).

A família Bromeliaceae é composta por espécies neotropicais, que sofreram uma extensa radiação adaptativa, ocupando ambientes extremos e com hábitos que variam de terrestres a epífitos. Essas plantas podem ser encontradas desde o nível do mar até altitudes superiores a 4.000 m, em regiões desérticas, úmidas e também em solos sujeitos a inundações periódicas, em locais com muito ou pouca luminosidade. Vivem muito bem sobre areias e rochas escaldantes e resistem a temperaturas próximas a 0 °C (BENZING, 2000).

As bromélias são plantas perenes, herbáceas, com rosetas foliares basais, raramente arbustivas ou arborescentes. Os caules são rizomas, prostrados ou estolões curtos ou longos, dos quais se elevam as rosetas. As margens das folhas podem ser lisas ou portar espinhos. As folhas lanceoladas inserem-se em espiral no caule formando uma roseta basal (cisterna). Quanto mais alargada a bainha foliar que forma a cisterna, mais a planta se torna capacitada a acumular água (JUDD et al., 1999; LEME, 1984). Na cisterna, conhecida como tanque, cuja capacidade às vezes ultrapassa 1 L, também são acumulados restos orgânicos de animais e vegetais, assim como uma série de microrganismos que auxiliam na decomposição da matéria orgânica. As cisternas também são utilizadas como fonte de recurso (abrigo, alimento, sítios reprodutivos, etc.) para muitas populações naturais de espécies associadas, grupo conhecido como fitotelmata (ex.: anfíbios, aranhas, insetos, crustáceos, etc.), entretanto as mesmas não estão presentes em todas as bromélias.

Taxonomia e evolução

Atualmente, são conhecidas cerca de 2.750 espécies (BENZING, 2000), distribuídas em aproximadamente 60 gêneros, dos quais quase 50% são encontrados no Brasil. Tradicionalmente, a família Bromeliaceae, está dividida em três subfamílias: Bromelioideae (~650 spp.), Pitcairnioideae (~890 spp.) e Tillandsioideae (~1000 spp.). Essa divisão baseia-se na análise dos seguintes caracteres morfológicos: flores, frutos, sementes e posição do ovário em relação ao perianto (SMITH; DOWNS, 1974; SMITH; DOWNS, 1977; SMITH; DOWNS, 1979).

Segundo Smith (1934), as bromélias teriam se originado na América do Sul, no Planalto das Guianas. As subfamílias Pitcairnioideae e Tillandsioideae, que possuem grande número de gêneros e espécies, teriam como centro de diversidade a região dos Andes, enquanto Bromelioideae tem seu centro de diversidade no leste do Brasil.

A falta de evidências fósseis é um dos principais pontos que torna difícil a reconstituição da filogenia da família Bromeliaceae. No entanto, não existem muitas dúvidas em relação à sua monofilia (GILMARTIN; BROWN, 1987; TERRY et al., 1997a, 1997b; CRAYN, 2004). Ademais, muitas são as especulações quanto à relação de Bromeliaceae com outras famílias. Da mesma forma, as relações entre as subfamílias e entre os gêneros têm sido temas muito polêmicos (SMITH, 1934; BROWN, 2000).

Gilmartin e Brown (1987) foram os primeiros a estudar as relações filogenéticas entre as três subfamílias de Bromeliaceae, por meio de características morfológicas. Esses autores concluíram que Bromelioideae e Tillandsioideae são táxons irmãos e que a subfamília Pitcairnioideae possui a posição mais ancestral na família.

A partir da década de 1990, as relações evolutivas em Bromeliaceae começaram a ser traçadas com base em dados de sequências de DNA. No entanto, os estudos de sistemática molecular em Bromeliaceae (RANKER et al., 1990; CLARK; CLEGG, 1990; GIVNISH et al., 1990a; 1990b) não se adequaram à filogenia sugerida pelos dados morfológicos de Gilmartin e Brown (1987) e as relações entre as subfamílias não encontraram um consenso (BROWN, 2000). A discrepância entre o grau de divergência molecular e morfológica nas bromélias é bem ilustrada pela subfamília Tillandsioideae, que, geneticamente, mostrou ser altamente similar (<1,8% de divergência genética), mas, morfológica e ecologicamente, é muito diversa (HORRES et al., 2000). Trabalhos mais recentes ainda discutem as relações e a monofilia das subfamílias e de seus gêneros (TERRY et al., 1997a; 1997b; HORRES et al., 2000; FARIA et al., 2004; BARFUSS et al., 2005).

Sistema de cruzamento

Apesar de ser uma família de grande valor econômico, em Bromeliaceae, poucos estudos sobre o sistema de cruzamento têm sido publicados. A fecundação cruzada é o sistema de cruzamento mais comumente encontrado entre as espécies de bromélias. No entanto, estudos da morfologia floral e experimentos de polinização confirmaram a existência de diversos sistemas de cruzamento. Tais estudos também demonstraram que aspectos da ecologia e da história natural estão relacionados ao tipo de sistema de cruzamento predominante nas espécies (MARTINELLI, 1994; BENZING, 2000).

Algumas características adicionais, que influenciam as proporções da progênie que são de autofecundação ou de fecundação cruzada, podem ser encontradas em muitas espécies. Dicogamia (maturação assincrônica dos órgãos sexuais) e heterostilia (diferença espacial entre os órgãos sexuais, que limita a autopolinização) promovem a alogamia em muitas espécies autocompatíveis e diminuem a obstrução do estigma em espécies autoincompatíveis (BENZING, 2000). Protoginia (amadurecimento do gineceu primeiramente) ocorre em quase 150 espécies do gênero Tillandsia, subgênero Tillandsia (GARDNER, 1982). Protandria (amadurecimento do androceu primeiramente) foi observado em 17 espécies de Vriesea polinizadas por pássaros e morcegos (MARTINELLI, 1994).

A cleistogamia foi relatada principalmente para espécies de Tillandsia (GARDNER, 1982, 1986; GILMARTIN; BROWN, 1985) e para Aechmea bracteata (Sw.) Griseb. (BENZING, 1980), tendo sido considerada um sistema derivado em Bromeliaceae por Brown e Gilmartin (1989).

Qualquer que seja a condição fundamental para a família, a fecundação cruzada é reforçada pela autoincompatibilidade amplamente encontrada nas subfamílias Bromelioideae e Tillandsioideae e, embora não confirmado, provavelmente em Pitcairnioideae também (BENZING, 2000). A autoincompatibilidade em Bromeliaceae foi geneticamente confirmada para Ananas comosus, A. ananassoides (Baker) L.B. Smith e A. bracteatus Lindl. Schult. e Schult.f. (BREWBACKER; GORREZ, 1987). Além disso, Paggi et al. (2007) relataram a ocorrência de autocompatibilidade e de sistema misto de cruzamento, com elevada taxa de autofecundação em Vriesea gigantea Gaud. A dioicia ocorre em todas as subfamílias, mas em poucas espécies. (BENZING, 2000). A grande maioria dos gêneros exibe hermafroditismo e alguns, como o gênero Catopsis, exibem espécies dioicas e hermafroditas.

Citogenética e citotaxonomia da família Bromeliaceae

A família Bromeliaceae é citogeneticamente muito homogênea, com pequena variação no número básico e no nível de ploidia. Apesar de essa família apresentar marcante diversidade morfológica e adaptação aos mais diversos ecossistemas, há uma relativa conservação quanto ao número cromossômico, com prevalência de 2n=50 cromossomos, sendo x=25 o número básico, com exceção de Cryptanthus x=17 (MARCHANT, 1967; BROWN et al., 1997; COTIAS-DE-OLIVEIRA et al., 2000; CEITA, 2002; PALMA-SILVA et al., 2004; GITAÍ et al., 2005).

A evolução cariotípica da família ainda não se encontra totalmente esclarecida. O pequeno tamanho dos cromossomos, as aneuploidias e as raças poliploides fenotipicamente indiferenciadas dificultam a tentativa de reconstruir o cariótipo original da família e de identificar a possível incidência de evolução reticulada (BENZING et al., 2000).

Os primeiros trabalhos propuseram x=8 como número básico para a família, inspirado nas primeiras contagens cromossômicas para Bromeliaceae (BILLINGS, 1904 citado por WEISS, 1965; LINDSCHAU, 1933 citado por WEISS, 1965; GAUTHÉ, 1965; WEISS, 1965; SHARMA; GHOSH, 1971; MCWILLAMS, 1974).

Brown e Gilmartin (1989), usando evidências filogenéticas obtidas a partir de dados morfológicos (GILMARTIN; BROWN, 1987), propuseram um modelo de evolução cariotípica, no qual Bromeliaceae e Velloziaceae (x=8) seriam táxons irmãos. Esses autores analisaram mais de 80 espécies pertencentes as três subfamílias. Segundo eles, o número básico x=25 teria se originado da hibridação entre paleodiploides, com números básicos x=8 e x=9, produzindo um paleotetraploide (n=17). Uma nova hibridação entre o paleodiploide (x=8) e a linhagem paleotetraploide (x=17) teria produzido o hexaploide (n=25). Essa teoria foi corroborada por Gitaí et al. (2005), que observaram a ocorrência de dois pares de cromossomos com satélites em espécies diploides, por meio da coloração com nitrato de prata.

A poliploidia do número básico x=25 tem sido raramente encontrada na família Bromeliaceae, ocorrendo na maior parte das vezes na subfamília Bromelioideae: Bromelia (duas espécies), Nidularium (uma sp.), Pseudananas (uma sp.), Orthophytum (três sp.), Deinacanthon (uma sp.) e Ananas (uma sp.). Em Pitcairnioideae, são relatados poliploides nos gêneros Dyckia (três sp.), Deuterocohnia (uma sp.), Pitcairnia (uma sp.) e Fosterella (uma sp.) (BROWN; GILMARTIN, 1986; COTIAS-DE-OLIVEIRA et al., 2000; GITAÍ et al., 2005). Em Tillandsioideae, poliploides são relatados para o gênero Guzmania (uma sp.) e para várias espécies do gênero Tillandsia pertencentes ao subgênero Diaphoranthema (BROWN; GILMARTIN, 1986).

A bimodalidade cariotípica em Bromeliaceae foi observada inicialmente por Marchant (1967). Certas espécies apresentaram variabilidade quanto ao tamanho dos cromossomos em um mesmo cariótipo, havendo em algumas delas uma clara bimodalidade. Cotias-de-Oliveira et al. (2000) estudaram espécies da subfamília Bromelioideae e Pitcairnioideae. Em algumas dessas espécies, foram observados cromossomos com tamanhos diferentes, mas não foi observada uma clara expressão de bimodalidade. Ceita (2002), por sua vez, não encontrou bimodalidade cariotípica em nenhum dos seis gêneros da subfamília Bromelioideae analisados. Palma-Silva (2003), ao estudar espécies de Tillandsioideae, observou uma nítida assimetria no tamanho dos cromossomos.

Gitaí et al. (2005) verificaram que indivíduos morfologicamente indistinguíveis de Deuterocohnia lorentziana (Mez) M.A. Spencer e L.B. Sm (Pitcairnioideae) apresentaram diferentes níveis de ploidia (2n=50 e 2n=150) e cromossomos com diferenças de tamanho e de morfologia. Indivíduos diploides apresentaram cromossomos maiores (de 1,14 µm a 2,29 µm) com tendência à bimodalidade (19 pares grandes e 6 pares pequenos), enquanto os tetraploides apresentavam cromossomos de menor tamanho (de 0,5 µm a 1,94 µm) com somente dois dos pares maiores.

Tais resultados sugerem a eliminação de sequências do genoma durante o processo de poliploidização ao longo da evolução da família Bromeliaceae. Assim, em Bromeliaceae, a fonte de variabilidade cromossômica seria dada pelo desenvolvimento de conjuntos bimodais e pela reorganização do padrão cariotípico. A evolução cromossômica frequentemente se processa a partir de conjuntos relativamente uniformes, todos com cromossomos metacêntricos e de tamanhos iguais, para conjuntos não uniformes (bimodais), que contêm cromossomos de tamanhos desiguais (MARCHANT, 1967; MCWILLIAMS, 1974).

Análises meióticas são raras em Bromeliaceae. Palma-Silva et al. (2004) realizaram o primeiro estudo do comportamento meiótico em indivíduos silvestres de bromélias, tendo observado alta regularidade meiótica em nove espécies do gênero Vriesea e duas do gênero Aechmea.

História antiga

Antes de Colombo fazer sua segunda viagem para as Américas, as bromélias eram desconhecidas pelos europeus. A maioria dos exploradores daquela época estava mais interessada em descobrir novas rotas comerciais e adquirir objetos de valor do que na descoberta de novas espécies. Embora muitas vezes a exploração portuguesa e espanhola seja associada com a ideia de subjugação religiosa dos nativos e um implacável interesse por metais e gemas preciosas, novas plantas comestíveis também foram itens importantes para favorecer ou recompensar a volta para casa (BENZING, 1980).

Não surpreende o fato de que, entre todas as bromélias que Colombo e sua tripulação provavelmente encontraram nas Índias Ocidentais, o abacaxi foi a única que realmente lhes chamou a atenção. Eles descreveram o fruto como “maior que um melão, cheiroso e de sabor muito adocicado” (BENZING, 1980).

As espécies de bromélias ornamentais permaneceram desconhecidas na Europa até que, em 1776, Guzmania ligulata (L.) Mez foi introduzida nesse continente. Depois disso, no século 19, outras espécies vistosas, como Billbergia pyramidalis Lindl., Billbergia amoena LOOD. LONDL. e Aechmea fasciata Baker, começaram a chegar, em número sempre crescente, na Inglaterra, França, Alemanha e em outros países do oeste da Europa. O cultivo de Bromelia antiacantha Bertol. foi iniciado por Bertolini na Itália, em 1824. Por volta de 1857, muitas espécies começaram a ser cultivadas em Berlim, o que foi evidenciado pelas numerosas citações de Beer “Die Familie der Bromeliaceen”, o primeiro estudo compreendendo todo o grupo. Entre 1865 e 1885 houve um grande interesse na família Bromeliaceae na região da Bélgica central, próximo a Liege, onde Edouard Morren publicou a descrição de várias espécies com elaboradas ilustrações na Belgique Horticole. Outros botânicos também tiveram grande importância no estudo de bromélias ornamentais na última metade do século 19, como C. Kock na Alemanha, Regel na Rússia, Antonie na Áustria e Lemaire, Linden e André na França. A maioria das espécies ornamentais, descritas nesse período e posteriormente, eram de origem brasileira (SMITH, 1955).

O cultivo de bromélias continuou a ganhar adeptos na Europa Central e Ocidental até o início do século 20, quando as condições políticas e econômicas culminaram na Primeira Guerra Mundial, provocando uma falta de estímulo na horticultura em geral. Após 1945, o interesse pelo cultivo de espécies de bromélias voltou a aumentar não só na Europa, mas também nos Estados Unidos, Austrália, Nova Zelândia e em outros países (BENZING, 1980).

A horticultura de bromélias desenvolveu-se mais tarde nos Estados Unidos, entretanto produtores já listavam espécies para venda desde o final do século 19. Na década de 1950, o cultivo de bromélias começou a contar com o apoio da Sociedade de Bromélias, muito importante até os dias de hoje. No Brasil, apesar de serem muito apreciadas nos jardins imperiais do Rio de Janeiro desde 1968, o interesse pelo seu cultivo para a comercialização como plantas ornamentais é muito recente.

História recente

Apesar das inúmeras finalidades para as quais as bromélias podem ser utilizadas, as quais já foram descritas neste capítulo, o seu valor ornamental é indiscutível e parece ser o principal potencial econômico das diferentes espécies pertencentes à família Bromeliaceae. No Brasil, a comercialização das bromélias como plantas ornamentais data aproximadamente do início da década de 1990. Neste País, assim como em outros de colonização latina, a valorização de espécies silvestres como plantas ornamentais é pouco tradicional, diferente do que acontece em países europeus, os quais têm incorporado em sua cultura a apreciação da jardinagem e da integração do homem com a natureza (TOMBOLATO et al., 2004). No Brasil, o precursor da utilização das bromélias em paisagismo foi Burle Marx, na década de 1960. Desde então, essas plantas foram lentamente conquistando a preferência dos paisagistas e consumidores. Além de agradar o gosto popular, as bromélias resolvem um problema do paisagismo moderno, que é a ocorrência, cada vez maior, de jardins pequenos. Essas plantas são de fácil adaptação e necessitam de pouca terra para sua sobrevivência (MARTINELLI, 2001; BIODIVERSITY REPORTING, 2006). Além disso, as bromélias preenchem pré-requisitos básicos quando pensamos em espécies ornamentais, já que apresentam beleza, durabilidade e versatilidade. Um dos aspectos interessantes é que as espécies podem não só apresentar flores vistosas, mas também brácteas e folhagens com grande apelo estético, podendo, ainda, uma planta durar vários meses. Aspectos como esses têm tornado essas plantas cada vez mais apreciadas, o que faz com que elas sejam mais extraídas da natureza (COFFANI-NUNES, 2002).

Apesar da crescente demanda na utilização de bromélias como plantas ornamentais, atualmente são poucos os produtores efetivos que atendem ao mercado consumidor, havendo, portanto, uma procura maior do que a oferta. Sendo assim, surge uma lacuna que é preenchida com o comércio ilegal de espécies de bromélias provenientes do extrativismo (COFFANI-NUNES, 2002). Por causa da clandestinidade da atividade extrativista, a obtenção de dados sobre a comercialização do produto torna-se bastante complexa. Um levantamento pioneiro foi realizado por COFFANI-NUNES (2002) com o objetivo de identificar a origem do material comercializado no eixo Rio–São Paulo; entretanto, o autor concluiu que determinar a origem das plantas pode ser uma tarefa bastante difícil, já que aspectos como o perfil socioeconômico e as características de cada região estão diretamente envolvidos nesse processo.

A diferenciação entre plantas produzidas em viveiros daquelas provenientes de extrativismo é bastante difícil, já que depende diretamente da declaração do comerciante. Em geral, o que se observa é que plantas cultivadas apresentam maior qualidade e uniformidade, e aquelas coletadas da floresta, em geral, apresentam folhas danificadas e pouca homogeneidade entre as matrizes. No Rio Grande do Sul, não há uma estimativa concreta da proporção de plantas provenientes de extrativismo; entretanto, os depoimentos dos paisagistas nos permitem inferir que grande parte do produto comercializado no estado ainda é proveniente de extrativismo ilegal1.

Existem muitas espécies ornamentais, ou mesmo com potencial ornamental, ainda sob exploração extrativista, principalmente por falta de pesquisas que definam técnicas de cultivo. Essas espécies são consideradas nativas, ou silvestres, e são definidas como aquelas não manipuladas pelo homem. Diversas espécies da flora brasileira, incluindo diferentes tipos de bromélias, pertencem a esse grupo de plantas. A partir da manipulação inicial dessas plantas, ainda sem um trabalho de melhoramento, as mesmas passam a ser denominadas semidomesticadas. A espécie é considerada domesticada somente após os processos de melhoramento genético e cultural. Algumas espécies nativas do Brasil foram domesticadas no passado, a exemplo do abacaxi, do amendoim e do cacau. Mais recentemente, algumas espécies ornamentais vêm sendo exploradas e denominadas como semidomesticadas, tais como orquídeas, petúnias e madressilvas (TOMBOLATO et al., 2004).

Perspectivas

Para que haja um aumento na produção comercial de bromélias, deve haver um investimento expressivo no setor. Entretanto, as práticas culturais adequadas às diferentes espécies só poderão ser aplicadas mediante o aumento da pesquisa na área. Aspectos básicos como sistema reprodutivo e número cromossômico ainda são desconhecidos para muitas espécies, o que torna inviável a domesticação e o melhoramento dessas plantas.

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1 Entrevista concedida pela profissional de paisagismo Bibiana Mariano da Rocha à professora Fernanda Bered, da UFRGS, em 2006.