Foto: Rosa Lía Barbieri
Clause Fátima de Brum Piana
Fernando Irajá Félix de Carvalho
A história do trigo cultivado está intrinsecamente relacionada com o desenvolvimento da civilização humana. A domesticação do trigo, iniciada há cerca de dez mil anos na região da Mesopotâmia (sudoeste da Ásia), permitiu que o homem deixasse para trás milhares de anos de existência errante, como caçador e coletor, estabelecendo-se em povoados e gerando seu próprio sustento. A capacidade de produzir alimento em grandes quantidades, aliada à possibilidade de armazenar excedentes, levou ao aumento da população e à evolução cultural. O homem das comunidades sedentárias adotou o trigo em tal extensão que este cereal é hoje a principal espécie cultivada no mundo.
Modernamente, a cultura do trigo tornou-se a base de sustentação para o desenvolvimento agrícola em diversas partes do mundo, impulsionando o avanço dos conhecimentos científico e tecnológico nesta área. O trigo contribuiu também para o crescimento da indústria, uma vez que gerou demanda por equipamentos e produtos agrícolas nas diversas etapas do processo de produção, desde a lavoura até a industrialização do grão. Esses resultados acabaram abrindo caminho e dando suporte para o desenvolvimento de outras espécies agrícolas, principalmente aquelas que produzem grãos, como a soja e o arroz.
Existem diversas espécies de trigo, silvestres e cultivadas, mas apenas duas têm grande importância econômica: o trigo comum ou trigo para pão (Triticum aestivum sin. T. vulgare), e o trigo duro ou trigo para macarrão (T. turgidum var. durum). O trigo comum representa cerca de 90% de todo o trigo cultivado no mundo, e o restante da área (aproximadamente 20 milhões de hectares) é quase todo ocupado pelo trigo duro.
Atualmente, o trigo cultivado conta com uma enorme variabilidade, compreendendo mais de 25 mil cultivares distintas, e revela alto rendimento em uma série de ambientes que se estende de 67° Norte (na Noruega, na Finlândia e na Rússia) a 45° Sul (na Argentina e no Chile). Embora seja mais bem adaptado a regiões de clima temperado, o trigo é também cultivado em algumas regiões tropicais e subtropicais, embora se trate, nesse caso, de trigo melhorado geneticamente, que apresenta, por exemplo, menor exigência de frio.
As cultivares mais modernas pertencem à espécie T. aestivum, que é altamente valorizada na fabricação de pão dada a grande quantidade de glúten presente no endosperma do grão. É a elasticidade da proteína do glúten que permite a retenção do dióxido de carbono (CO2) formado durante a fermentação da levedura e, consequentemente, possibilita o crescimento da massa. As principais regiões produtoras de trigo comum no mundo são: sudoeste da Rússia e Ucrânia, planície central dos Estados Unidos e as áreas adjacentes no Canadá, noroeste da Europa, bacia do Mediterrâneo, centro-norte da China, Índia, Argentina e sudoeste da Austrália.
O trigo duro é cultivado em regiões relativamente secas, particularmente na bacia do Mediterrâneo, na Austrália, na Índia, na antiga União Soviética e em áreas de baixa pluviosidade das grandes planícies dos Estados Unidos e do Canadá. Seus grãos duros produzem farinha com baixo teor de glúten, que é adequada para a fabricação de macarrão e de produtos de semolina.
O grão de trigo contém a maioria dos nutrientes essenciais para o homem: carboidratos (de 60% a 80%), principalmente na forma de amido; proteínas (de 8% a 15%), incluindo quantidades adequadas de todos os aminoácidos essenciais, exceto lisina, triptofano e metionina; gorduras (de 1,5% a 2,0%); minerais (de 1,5% a 2,0%) e vitaminas (E e do complexo B). Além do seu alto valor nutritivo, a baixa quantidade de água no grão, a facilidade de processamento e de transporte, bem como a boa qualidade de armazenamento, fizeram do trigo o alimento básico de cerca de 35% da população mundial.
Durante os últimos 60 anos, o rendimento médio do trigo aumentou de 1,0 t/ha para 3,0 t/ha, principalmente em virtude do uso de adubos e de cultivares melhoradas. Em 2005, a cultura do trigo ocupou uma área de 216 milhões de hectares, principalmente no hemisfério norte, que produziu 626 milhões de toneladas, representando 28% da produção mundial de cereais.
O trigo, a cevada e a aveia constituem, junto com outras gramíneas importantes, a tribo Triticeae da família Poaceae (Gramineae). Relações entre espécies dentro dessa tribo têm sido extensivamente estudadas por meio da análise de genomas. A subtribo Triticinae é constituída pelos gêneros Triticum, Aegilops, Agropyron, Secale e Haynaldia, que apresentam origem relativamente recente e, eventualmente, podem intercruzar-se (BRAMMER, 2003). Hibridações entre gêneros dentro dessa subtribo possibilitaram a troca de constituintes genéticos e levaram à formação de espécies poliploides. As formas poliploides do trigo se originaram de hibridações naturais entre os gêneros Triticum e Aegilops, combinando genomas completos de duas ou três espécies diploides distintas. Cada um desses genomas contém o número básico de sete cromossomos (x=7) e é designado por uma letra maiúscula (Tabela 1). Assim, existem trigos diploides, tetraploides e hexaploides, como, por exemplo, T. monococcum (2n=2x=14, genoma AA), T. dicoccum (2n=4x=28, genoma AABB) e T. aestivum (2n=6x=42, genoma AABBDD), respectivamente.
Tabela 1. Classificação dos trigos cultivados e das espécies silvestres relacionadas.
(1) Não foram apresentadas todas as espécies do gênero Aegilops.
Fonte: Adaptado de Feldman et al. (1995).
É consenso entre os pesquisadores que as espécies silvestres diploides, embora tenham divergido consideravelmente entre si, têm origem monofilética, ou seja, possuem um ancestral comum. A divergência entre essas espécies está particularmente evidente na morfologia da espiga, nas necessidades ecológicas e na distribuição geográfica de cada uma. Dados citogenéticos também têm confirmado a classificação taxonômica ao mostrar que cada espécie contém um genoma distinto (KIHARA, 1954). A descrição de cromossomos dos diferentes genomas mostra que eles apresentam pequena afinidade entre si. Como consequência, eventuais híbridos interespecíficos têm pareamento cromossômico irregular durante a meiose, o que determina esterilidade (FELDMAN et al., 1995). Isso submete essas espécies diploides ao isolamento reprodutivo, caracterizando a divergência genética.
As espécies de trigo poliploides são exemplos clássicos de evolução por anfiploidia, isto é, pela união de genomas de espécies diferentes. Os poliploides podem surgir por duplicação de células somáticas ou, sexualmente, por fusão de gametas citologicamente não reduzidos. Já houve muita discussão, desde o início do século, em torno dessas duas teorias; entretanto, nos dias de hoje já é admitida como mais provável – considerando-se todas as informações atuais – a origem pela união de gametas não reduzidos. Sendo assim, se há na natureza espécies poliploides oriundas de duplicação somática, elas são muito pouco frequentes (SCHIFINO-WITTMANN, 2004). Segundo Harlan e De Wet (1975), os casos de poliploidia somática são raros e de difícil comprovação científica.
Ainda assim, pesquisadores que se dedicam ao estudo da evolução do trigo, entre os quais se destaca Moshe Feldman, afirmam que cada espécie poliploide de trigo pode ser identificada como o resultado de uma hibridação seguida de duplicação cromossômica (Figura 1); portanto, a poliploidização do trigo teria ocorrido depois da fertilização, em células somáticas. Contudo, tal afirmação não significa, necessariamente, que esses pesquisadores sejam contrários à teoria dominante de que os poliploides surgiram pela união de gametas não reduzidos; pode significar apenas que o trigo é um dos raros exemplos de poliploides originados por duplicação somática. A alopoliploidia natural que originou os poliploides do gênero Triticum tem sido verificada pela análise de híbridos entre espécies de diferentes níveis de ploidia.
Figura 1. Representação do processo de formação dos trigos poliploides.
Tradicionalmente, os poliploides são classificados em autopoliploides, originados pela duplicação de um mesmo genoma; e alopoliploides, originados pela duplicação de genomas distintos (SCHIFINO-WITTMANN, 2004). Um terceiro tipo, intermediário aos dois primeiros, é descrito por Stebbins (1971). Trata-se dos poliploides segmentares, originados pela duplicação de genomas de espécies próximas o suficiente para apresentarem homeologia (homologia parcial) cromossômica. Considerando-se que os diferentes genomas do trigo são estreitamente relacionados, uma vez que se originaram de um mesmo ancestral, os poliploides estão mais para segmentares do que para alopoliploides genômicos típicos. Mas, apesar da existência de homeologia cromossômica entre os genomas do trigo, os poliploides se comportam como anfiploides típicos: seus cromossomos pareiam como se fossem diploides, e o modo de herança é dissômico. E parece que esse comportamento é comum em poliploides estabelecidos, pois mesmo tendo mais de dois genomas iguais ou similares, ao longo do tempo eles tendem a se comportar como diploides.
Existem cada vez mais evidências de que pode ocorrer uma ampla, e muitas vezes rápida, mudança genômica após a formação dos poliploides, em todos os níveis do genoma, do DNA ao cromossomo. Estudos recentes em várias espécies poliploides mostram que a diploidização – processo evolutivo pelo qual o genoma poliploide se transforma em um diploide – ocorreu por uma ampla reestruturação, com alterações e mudanças no nível gênico, incluindo evolução coordenada, silenciamento gênico, reestruturação cromossômica, ação de transposons e novos padrões de expressão gênica. Contudo, a base genética da diploidização ainda é um grande mistério (SCHIFINO-WITTMANN, 2004).
O comportamento diploide dos trigos poliploides se deve à ação de um gene específico que suprime o pareamento de cromossomos homeólogos (que são parcialmente homólogos). No hexaploide T. aestivum, esse gene é conhecido como Ph 1 e se localiza no braço longo do cromossomo 5 do genoma B (RILEY; CHAPMAN, 1958).
O desenvolvimento desse mecanismo de diploidização foi essencial para a evolução e a domesticação dos trigos poliploides. Restringindo o pareamento aos cromossomos completamente homólogos (que apresentam a mesma morfologia e são portadores dos mesmos genes), o gene de diploidização promoveu a segregação regular do conjunto cromossômico e a alta estabilidade genética dessas espécies. Trigos poliploides sintéticos que não contêm esse gene são parcialmente estéreis, em razão de desordens no pareamento cromossômico durante a meiose. Uma outra vantagem desse mecanismo é que ele facilita a diploidização genética, pois os genes presentes em dose dupla ou tripla podem ser direcionados para novas funções.
De acordo com Feldman et al. (1995), são reconhecidos três grupos de poliploides, e as espécies dentro de cada grupo têm um genoma em comum, que diferem em relação aos demais. Os poliploides do primeiro grupo compartilham o genoma A dos trigos diploides, T. monococcum (Am) e T. urartu (Au); os do segundo grupo apresentam o genoma D do Aegilops tauschii sin. Ae. squarrosa; e aqueles do terceiro grupo partilham o genoma U do Ae. umbellulata. Os poliploides de cada grupo se parecem com o doador do genoma do eixo comum, particularmente na estrutura da espiga. Os trigos poliploides cultivados pertencem ao primeiro grupo. A espiga em forma de lança do trigo diploide silvestre pode ser reconhecida nos poliploides silvestres, enquanto a espiga menos quebradiça do cultivado T. monococcum var. monococcum reaparece nos poliploides cultivados, que compreendem os tetraploides T. turgidum (AABB) e T. timopheevi (AAGG) e o hexaploide T. aestivum (AABBDD).
Tem ampla aceitação na comunidade científica a teoria de que o trigo hexaploide se originou de duas hibridações independentes seguidas de duplicações espontâneas dos cromossomos desses híbridos. Entretanto, ainda não existe consenso quanto às espécies diploides que teriam originado os poliploides. O hexaploide T. aestivum (AABBDD) contém dois genomas homólogos aos genomas A e B do T. turgidum. Esse fato sustenta a hipótese de que o T. aestivum teria surgido da hibridação entre o T. turgidum e uma espécie diploide com o genoma D.
A identificação das espécies doadoras dos genomas B, G e D tem sido objeto de estudos citogenéticos intensivos. O doador do genoma D do trigo hexaploide foi identificado como o silvestre Ae. tauschii (McFADDEN; SEARS, 1946). A comprovação desses trabalhos de identificação foi obtida por meio de hexaploides sintéticos oriundos de cruzamentos artificiais entre Ae. tauschii e diferentes variedades de T. turgidum, os quais mostraram grande semelhança com o hexaploide estabelecido T. aestivum. Frequentemente, híbridos entre sintéticos e hexaploides naturais são altamente férteis. Mais recentemente, estudos moleculares também têm corroborado essa teoria. Huang et al. (2002), ao verificarem que sequências do genoma D de T. aestivum e de Ae. tauschii são idênticas confirmaram que T. aestivum resultou da hibridação de T. turgidum com Ae. tauschii há apenas 8 mil anos.
Os genomas A e B do trigo hexaploide poderiam ter sido doados tanto pelo silvestre T. turgidum var. dicoccoides quanto pelo cultivado T. turgidum var. dicoccum, mas as evidências geográficas têm apontado para o cultivado. A distribuição do silvestre T. dicoccoides se sobrepõe à do Ae. tauschii somente em uma área muito limitada no oeste do Irã e no leste da Turquia, enquanto o trigo cultivado T. turgidum, especialmente var. dicoccum, de tempo em tempo era semeado ao longo da área de distribuição do Ae. tauschii. Além disso, e considerando-se o modo de dispersão das sementes do tetraploide silvestre dicoccoides e do Ae. tauschii, seria muito pouco provável que um anfiploide originado dessas duas espécies fosse capaz de disseminar efetivamente as suas sementes – o que, fatalmente, resultaria na sua rápida eliminação. Sendo assim, parece mais razoável que o hexaploide tenha se originado nos campos de trigo depois da dispersão do cultivado T. turgidum dentro da área do Ae. tauschii. Isso poderia explicar também o motivo pelo qual o trigo hexaploide, em contraste com a maioria dos outros cereais, tem parentes não silvestres (FELDMAN et al., 1995).
A julgar por sua enorme variabilidade, os trigos hexaploides foram provavelmente formados por numerosos cruzamentos recorrentes envolvendo diferentes tipos de Ae. tauschii. O doador do genoma D cresce hoje dentro e nas margens de campos de trigo no Irã e na Armênia. Em geral, híbridos naturais entre tetraploides e Ae. tauschii podem ser encontrados nessas regiões, e frequentemente alguns grupos aparecem com 42 cromossomos em razão da formação de gametas não reduzidos. Ae. tauschii também tem amplo contato geográfico com T. timopheevi (AAGG) em suas formas silvestre e cultivada, mas não se conhece nenhum hexaploide natural derivado dessas duas espécies.
Mesmo não havendo mais dúvidas em relação às duas espécies das quais se originou o hexaploide T. aestivum, ainda era preciso elucidar que espécies diploides teriam cruzado para formar o tetraploide T. turgidum. Contrastando com a relativa facilidade com que o doador do genoma D foi encontrado, a identificação da espécie doadora do genoma B do tetraploide parece ainda estar longe de ser concluída. Evidências morfológicas, geográficas e citológicas têm sido usadas para relacionar o diploide silvestre Ae. speltoides (genoma S) ao surgimento do T. turgidum. Entretanto, dados citogenéticos indicam que o Ae. speltoides pode ser tanto o doador do genoma G do T. timopheevi quanto do genoma B do T. turgidum. Híbridos entre essas duas espécies tetraploides apresentam sinapse parcial e alta esterilidade, indicando que o genoma B do T. turgidum não é homólogo ao genoma G do T. timopheevi. Os dois contribuintes tetraploides poderiam ter surgido por cruzamentos entre formas silvestres do T. monococcum e duas espécies diploides distintas (Figura 2), ou por origem monofilética (FELDMAN et al., 1995).
Figura 2. Representação de algumas hipóteses propostas para explicar a origem dos trigos tetraploides.
Segundo Miller (1987), uma homologia incompleta entre os genomas S e G tem contribuído para a suposição de que G sofreu algumas modificações no nível tetraploide. Na hipótese de que os genomas B e G são monofiléticos (Figura 3), B poderia ter se diferenciado de G a partir do silvestre T. timopheevi, ou de um tetraploide mais antigo de constituição AASS. De qualquer forma, nos dois casos os genomas B e G teriam de ser considerados como genomas S modificados (FELDMAN et al., 1995).
Figura 3. Representação de algumas hipóteses propostas para explicar a origem dos trigos tetraploides.
a) T. timopheevi e T. turgidum se originaram de cruzamentos com espécies diploides distintas.
b) T. timopheevi e T. turgidum se originaram do mesmo cruzamento.
A ocorrência de um genoma modificado ou de genomas lado a lado onde um deles permanece estável (muito similar àquele de um diploide existente) é característica não só de poliploides com genoma A, mas de todos os genomas do gênero Triticum. Acredita-se que essa constituição tenha resultado de hibridação entre poliploides iniciais que compartilhavam um genoma e diferiam em um ou dois outros (ZOHARY; FELDMAN, 1962). Tais hibridações são facilitadas pelo genoma compartilhado, o qual atua como um tampão que assegura certa fertilidade aos híbridos resultantes. Nesses híbridos, os dois genomas diferenciais (originados de genitores diferentes) podem trocar constituintes genéticos que se tornam assimilados. Da mesma forma, nos poliploides com o genoma A o anfiploide inicial (AASS) poderia ter trocado segmentos de cromossomos com outro anfiploide ou com diploides como Ae. longissima (genoma Sl), Ae. bicornis (genoma Sb) ou outros. Como resultado dessas introgressões (incorporações de pedaços de cromossomos de outras espécies por meio de sucessivos retrocruzamentos), o genoma S teria se modificado em diferentes direções, originando G e B (FELDMAN et al., 1995).
Durante muitos anos, evidências morfológicas, citogenéticas e geográficas sustentaram o T. monococcum como doador do genoma A dos trigos poliploides. Entretanto, Huang et al. (2002), analisando sequências dos genes Acc-1 (plastídio acetil-CoA carboxilase) e Pgk-1 (plastídio 3-fosfoglicerato quinase) de Triticum e de Aegilops para determinar relações filogenéticas entre essas espécies e estabelecer a cronologia da evolução do trigo, apontaram o T. urartu (genoma Au) como doador do genoma A dos trigos tetraploides e hexaploides. O genoma A do tetraploide T. turgidum teria divergido daquele do T. urartu há menos de 500 mil anos, indicando uma origem relativamente recente dos poliploides. Como consequência, hoje o modelo que explica a origem dos trigos poliploides substitui T. monococcum, genoma Am, por T. urartu, genoma Au (Figura 4).
Figura 4. Representação da origem e evolução do trigo.
Em contraste com os diploides, que são geneticamente isolados uns dos outros e sofreram evolução divergente, os poliploides apresentam evolução convergente porque contêm constituintes genéticos de dois ou três genomas diploides diferentes e podem, por hibridação ou introgressão, trocar genes entre si, resultando em numerosas recombinações genômicas. Sendo assim, os poliploides têm importância evolutiva, sobretudo porque facilitaram a formação de uma superestrutura que reúne constituições genéticas de diploides isolados, permitindo a recombinação. Para Feldman et al. (1995), a poliploidia, reforçada pelo mecanismo de diploidização e por uma predominante endogamia, provou ser um sistema genético muito bem-sucedido. A vantagem evolutiva dos poliploides sobre os diploides seria, portanto, óbvia, e estaria refletida na sua ampla variação morfológica e adaptabilidade a diferentes ambientes.
Outra teoria, entretanto, contrapõe-se a essa com o argumento de que nos diploides uma simples mutação adaptativa poderia ter efeito direto no ajuste da constituição genética da espécie a um ambiente distinto, enquanto nos poliploides o poder tampão atuaria encobrindo o efeito de uma mutação que ocorresse em apenas um dos genomas. Isso, portanto, reduziria a capacidade adaptativa dos poliploides num curto espaço de tempo.
Vestígios fósseis da cultura do trigo foram encontrados em antigos povoados agrícolas numa região conhecida como Crescente Fértil, no sudoeste da Ásia (Oriente Próximo). O Crescente Fértil era uma região propícia à agricultura, que abrangia uma faixa de terra em forma de meia-lua (lua crescente) partindo da costa leste do Mar Mediterrâneo, avançando na direção do Golfo Pérsico e incluindo toda a Mesopotâmia (área entre os rios Tigre e Eufrates).
As evidências mais remotas da utilização do trigo vieram do sítio Ohalo II em Israel, onde foi encontrado o tetraploide silvestre T. dicoccoides, datando de 17.000 anos a.C. (KISLEV, 1992); mas é possível que tenha sido utilizado em período anterior, já que uma amostra dessa espécie foi encontrada em Nohel Oren (Israel) datando de 28.000 anos a.C. Os achados mais antigos de trigo cultivado são do tetraploide T. dicoccum, em Tel Aswad, na Síria, e do diploide T. monococcum em Tel Abu Hureyra, também na Síria, datados de 8.000 e 7.500 anos a.C., respectivamente (ZOHARY; HOPF, 1988). No decurso da domesticação, essas duas espécies se dispersaram do Oriente Médio para a Europa Central e Ocidental (Figuras 5 e 6). O tetraploide T. dicoccum chegou às Ilhas Britânicas antes de 4.000 anos a.C. Atualmente, esses trigos antigos são mantidos como culturas na Espanha, na Itália, na Turquia, nos Bálcãs e na Índia, pelo seu valor histórico (FELDMAN et al., 1995).
Figura 5. Origem e dispersão do diploide T. monococcum (einkorn).
Fonte: Agropolis Museum (2006).
Figura 6. Origem e dispersão do tetraploide T. turgidum (emmer).
Fonte: Agropolis Museum (2006).
Os tetraploides silvestres T. timopheevi var. araraticum e T. turgidum var. dicoccoides são morfologicamente indistinguíveis e, considerando-se suas atuais distribuições geográficas, admite-se que vestígios arqueológicos (grãos carbonizados, espiguetas e impressões na argila) encontrados no Jarmo e no Cayonu Tepesi, entre 6.500 e 7.000 anos a.C., possam pertencer a qualquer uma dessas duas espécies. Da forma cultivada do T. timopheevi originou-se somente um número restrito de cultivares, todas encontradas na Armênia e na Transcaucásia; enquanto o T. dicoccum é o predecessor da maioria dos trigos cultivados tetraploides e hexaploides, tendo ocorrido em povoados pré-históricos do Oriente Próximo por volta de 8.000 anos a.C. Durante o sétimo milênio a.C., a variedade dicoccum, junto com o T. monococcum, teve uma rápida dispersão pelas áreas agrícolas do Oriente Próximo. O diploide T. monococcum era conhecido como “einkorn” por apresentar apenas um grão por espigueta, enquanto as variedades dicoccoides e dicoccum do tetraploide T. turgidum, que possuem dois grãos por espigueta, popularizaram-se como “emmer”. É possível que formas silvestres de ambos – einkorn e emmer – tenham sido colhidas por todo o Crescente Fértil da Mesopotâmia e da Síria muito tempo antes do desenvolvimento da agricultura planejada. É provável que o cultivo de cereais tenha se iniciado em áreas adjacentes das regiões de maior abundância de formas silvestres, como Ali Kosh (Irã), Tell es Sawwan (planícies da Mesopotâmia), Tel Ramad (Síria), Jericó (Israel) e Beidha (Jordânia).
Evidências acumuladas nos últimos anos indicam que a agricultura não teve suas origens nos férteis vales dos rios da Mesopotâmia, que se tornaram importantes centros da civilização primitiva, mas em regiões montanhosas e semiáridas próximas. A datação de foices de sílex e moinhos de pedra, descobertas feitas nessas regiões, indica que o homem começou a colheita de grãos antes de 8.000 anos a.C., e mil anos mais tarde esses grãos já eram cultivados (HEISER, 1977).
Os primeiros cereais domesticados foram a cevada e o trigo. No início do processo de domesticação, o homem colhia as sementes maiores para alimentar-se, e daquelas que não eram colhidas se originava, espontaneamente, a próxima geração. Assim, se existia qualquer pressão de seleção, era a favor dos caracteres do tipo silvestre. Entretanto, logo que o homem começou a semear parte de sua colheita, essa situação mudou drasticamente. Passaram a existir duas populações, uma espontânea e outra cultivada pelo homem, e as pressões de seleção que atuavam sobre elas eram em sentidos opostos. As melhores sementes colhidas passaram a ser utilizadas para semear a população cultivada; desse modo, qualquer modificação genética que melhorasse a recuperação e a competição da semente no novo ambiente era selecionada. Como consequência, a seleção automática para conjuntos de caracteres inter-relacionados foi rapidamente estabelecida (HARLAN, 1992).
Sob muitos aspectos, o trigo pode ser considerado uma espécie extremamente adaptada à domesticação. Suas sementes grandes eram um atrativo para o coletor antigo, e seu hábito anual, que lhe permitia escapar da estação seca, era apropriado para a agricultura naquele tipo de ambiente. Além disso, o sistema de autopolinização predominante teria ajudado na fixação de mutantes desejáveis e de recombinantes resultantes de eventos raros de cruzamentos naturais. Ao mesmo tempo em que ocupava os solos pobres e rochosos de seus sítios naturais, o trigo silvestre mostrava resposta adequada quando transferido para ambientes mais ricos (FELDMAN et al., 1995).
A domesticação do trigo, contudo, foi limitada pela estrutura das espigas e pelo método de dispersão das sementes. Os trigos silvestres são caracterizados por espigas quebradiças que se desarticulam liberando as espiguetas quando maduras. Essas espiguetas têm formato de lança e se constituem nas unidades de dispersão das sementes. Mas, ao mesmo tempo em que a espiga quebradiça, ao liberar suas espiguetas, facilitava a penetração das sementes no solo, ela se tornava um inconveniente para o agricultor antigo, que era obrigado a coletar as sementes da terra ou cortar os colmos antes que eles atingissem a maturação. Não é surpresa, portanto, que plantas com espigas não quebradiças fossem inconscientemente selecionadas desde o início da domesticação. Outra característica das espiguetas de trigos silvestres é o fato de as duas glumelas (pálea e lema) que envolvem o antécio ficarem aderidas ao grão, de modo que, mesmo depois da debulha, os grãos permanecem recobertos pelas glumelas. Em cultivares de trigo modernas, essa característica é rara, pois as plantas que se dispersaram sob domesticação são derivadas de mutantes com glumelas frouxas que liberam facilmente seus grãos na debulha. Essas formas são conhecidas como espécies de debulha livre ou de grão nu.
O emmer foi a variedade cereal de maior destaque nos primeiros povoados agrícolas do Oriente Próximo. Os trigos duros presumivelmente se originaram do emmer cultivado por um acúmulo de mutações que foram reduzindo a dureza das glumelas até que a debulha livre fosse atingida. A maioria dos outros trigos tetraploides de grão nu pode ter origem relativamente recente, distinguindo-se da variedade durum em poucos caracteres e compartilhando o sistema genético que determina a debulha livre. O T. turgidum var. carthlicum é o único tetraploide conhecido que possui um complexo gênico diferente determinando a debulha livre. Esse complexo é conhecido como fator Q e está presente também nos trigos hexaploides. A estreita distribuição do T. carthlicum na Transcaucásia pode indicar que essa variedade tem origem recente, possivelmente por hibridação com um hexaploide do grupo aestivum (FELDMAN et al., 1995).
O hexaploide T. aestivum provavelmente teve origem e foi introduzido para cultivo somente depois da domesticação mais ou menos simultânea das formas diploides e tetraploides. Os primeiros achados arqueológicos do hexaploide são de Can Hasan, na Turquia (antiga Anatólia), datados de 7.000 anos a.C. Outras descobertas, identificadas como formas ancestrais dos hexaploides de debulha livre, foram desenterradas em Tepe Sabz (Curdistão iraniano), em Tell es Sawwan (Iraque), em Çatal Hüyük e Hacilar (Turquia), e em Knossos (Creta). Entre 6000 e 5000 a.C., o hexaploide alcançou a agricultura irrigada das planícies da Mesopotâmia e do oeste do Irã, chegando à bacia do Nilo no quinto milênio a.C. (Figura 7). Formas densas de T. aestivum foram cultivadas, no fim do quarto milênio a.C., na Europa Central e Ocidental, onde foram encontradas associadas com os primeiros traços de atividade agrícola junto com o einkorn e o emmer (FELDMAN et al., 1995).
Figura 7. Origem e dispersão do hexaploide T. aestivum.
Fonte: Agropolis Museum (2006).
Enquanto os trigos tetraploides, originários do Oriente Próximo, adaptavam-se a invernos temperados e a verões pouco chuvosos, o genoma D, oriundo da Ásia Central, deve ter contribuído para a adaptação dos trigos hexaploides a climas continentais. Isso pode ter facilitado a dispersão do trigo comum para a Ásia Central, e daí para o Vale Indus, onde apareceu no início do sexto milênio a.C. As evidências mais antigas registradas na China são da metade do terceiro milênio a.C.
Os hexaploides variedades spelta, vavilovvi e macha têm grãos com glumelas aderidas, enquanto as variedades aestivum, compactum e sphaerococcum expressam o caráter debulha livre e são consideradas mais avançadas (Tabela 1). O fator genético composto que determina o caráter grão nu (fator Q) está localizado no cromossomo 5 do genoma A e pode ter surgido do gene recessivo q, das variedades com glumelas aderidas ao grão, por uma série de mutações. Cinco alelos do gene q do T. spelta têm o mesmo efeito que dois alelos de Q. A teoria de que os trigos hexaploides de grãos com glumelas aderidas são mais primitivos tem sido sustentada por evidências genéticas (Figura 8). Quase todos os trigos tetraploides, tanto de grão nu quanto de grão com glumelas aderidas, foram cruzados com todas as raças conhecidas de Ae. tauschii e originaram tipos com glumelas aderidas ao grão. Somente a variedade carthlicum, que contém o fator Q dos hexaploides, produz formas de grão nu quando cruzada com Ae. tauschii. Tipos como aestivum e compactum aparecem como segregantes de cruzamentos entre spelta iraniano e spelta europeu, indicando que essas formas provavelmente contenham loco de q composto que pode recombinar em híbridos, produzindo locos duplicados ou até mesmo triplicados. O efeito desses locos múltiplos se assemelha àquele do fator Q (FELDMAN et al., 1995).
Figura 8. Relações evolutivas entre os trigos Triticum e Aegilops.
Fonte: Feldman et al. (1995).
Contudo, esses resultados genéticos não estão de acordo com a cronologia arqueológica. Apesar do T. aestivum ter sido abundante no Oriente Próximo pré-histórico a partir do sexto milênio a.C., ainda não foram encontradas indicações do cultivo de T. spelta ou de outras formas com glumelas aderidas ao grão antes de 2000 a.C. Além disso, na Europa Central o T. spelta apareceu cerca de mil anos mais tarde que as formas compactas de trigo com debulha livre. Se os primeiros hexaploides possuíam grãos com glumelas aderidas, a ausência dessas formas nos restos pré-históricos no Oriente Próximo indica que eles não foram cultivados naquela área, possivelmente por não apresentarem vantagem em relação ao emmer cultivado. Entretanto, atualmente o T. spelta é cultivado em ambientes extremos, próximos à área de contato entre T. dicoccum e Ae. tauschii – e é possível que esse cultivo seja de origem antiga. Existem duas hipóteses para o surgimento do trigo spelta na Europa. A primeira sugere que o hexaploide foi levado para lá relativamente tarde (2000 a.C.), substituindo o tipo de espiga densa e debulha livre cultivado pelos habitantes lacustres da região do alto Reno, particularmente em altitudes elevadas, onde as temperaturas eram extremas. Pela segunda hipótese, o T. spelta teria ressurgido no vale do Reno como resultado de um cruzamento entre uma forma hexaploide de espiga densa e o tetraploide T. dicoccum, ambos já cultivados na região. Tal cruzamento poderia produzir progênies hexaploides que não possuíssem o fator Q do genitor de espiga densa e debulha livre (FELDMAN et al., 1995).
O hexaploide de grão nu, mais adaptado economicamente, pode ter competido com, ou substituído, o tetraploide emmer antes do surgimento dos tetraploides de grão nu. Do T. aestivum var. aestivum originaram-se as variedades compactum e sphaerococcum por mutação. A variedade compactum é cultivada hoje em áreas restritas da Europa, no Oriente Próximo e no noroeste dos Estados Unidos, enquanto a variedade sphaerococcum é semeada na Ásia Central e em partes da Índia, onde é conhecida desde o terceiro milênio a.C.
De acordo com Feldman et al. (1995), os trigos diploides e tetraploides foram cultivados primeiramente na área de Zagros, enquanto os hexaploides se originaram no sudoeste do Mar Cáspio. Como o homem migrou para novas áreas, os trigos cultivados encontraram novos ambientes, aos quais responderam com ampla variabilidade, resultando em muitas formas endêmicas, isto é, peculiares a determinadas regiões. Vavilov descreveu centros secundários de variação para o trigo: as planícies da Etiópia e a bacia do Mediterrâneo, para os tetraploides, e a área Hindu Kush do Afeganistão, para os hexaploides. A Transcaucásia é um centro secundário de ambos os tipos. Para os melhoristas de trigo, esses centros secundários são valiosos bancos de genes adicionais àqueles que existem nos centros de origem primários.
O trigo hexaploide chegou ao Novo Mundo logo após sua descoberta, em 1492. Existem diversas lendas sobre a introdução do trigo na América, mas o registro da vinda de sementes de trigo e de cevada para cultivo remonta à segunda viagem de Cristóvão Colombo ao continente, em 1493. Segundo Arias (1999), não se sabe se foi a partir dessa primeira introdução que o trigo se propagou para o resto do continente, mas é certo que essas sementes foram efetivamente semeadas em 1493 pelos espanhóis que ficaram, e que o resultado não foi positivo. Na América do Sul o trigo foi semeado pela primeira vez em 1527, na atual Província de Santa Fé, na Argentina. Depois da conquista do Peru, em 1531, o cultivo do trigo se expandiu pelas áreas mais elevadas dos Andes, suplantando o “trigo do Inca” (Amaranthus e Quinoa).
No Brasil, o trigo foi introduzido provavelmente por Martim Afonso de Souza, em 1534, e expandiu-se da Capitania de São Vicente para outras regiões do País, acompanhando os deslocamentos das populações de origem europeia ou os trabalhos de catequização realizados pelas missões religiosas (SOUSA; ROSA, 1985).
As cultivares de trigo modernas foram desenvolvidas em três principais fases: a) seleção subconsciente pelos produtores de alimento mais antigos, simplesmente pelo processo de colher e semear; b) seleção com caráter predominantemente intencional em meio a populações geneticamente variáveis, em campos de agricultores primitivos ou medievais; c) seleção cientificamente planejada, no melhoramento moderno. Os principais resultados da primeira fase de seleção foram: espigas não quebradiças, amadurecimento simultâneo dos grãos; germinação rápida e sincronizada e, talvez, colmos um pouco mais eretos e espigas com debulha livre. Também foi nessa fase que o cultivo do trigo se expandiu para novas áreas, permitindo que a cultura expressasse adaptação a diferentes ambientes. Na segunda fase, os agricultores antigos selecionavam e semeavam os grãos mais desejáveis para cada necessidade específica. A pressão de seleção foi, portanto, exercida conscientemente, mas em diferentes direções por diversos agricultores. Esses esforços resultaram em ganho de rendimento, aumento do tamanho do grão, melhor qualidade da farinha e ampla adaptação a diferentes climas e sistemas de cultivo. Além disso, a mistura de numerosos genótipos em um mesmo campo permitiu que os genótipos à disposição dos agricultores primitivos fossem melhorados pela ocorrência ocasional de combinações e de recombinações desejáveis (FELDMAN et al., 1995).
Sob condições modernas, os campos de trigo têm se tornado tão uniformes geneticamente que trocas de genes espontâneas são bem menos prováveis. Por outro lado, a migração de genes tem crescido enormemente com a introdução e a troca de cultivares ao redor do mundo. Nos séculos 17 e 18, começaram de forma efetiva os trabalhos voltados para o melhoramento de plantas cultivadas, por meio de intercâmbio de genótipos, hibridações artificiais e seleções planejadas. Com a redescoberta dos trabalhos de Mendel, no século 20, novas técnicas para identificação e manipulação de genes desejáveis foram surgindo. Entretanto, as hibridações têm se restringido principalmente a cruzamentos intraespecíficos e pouco uso tem sido feito dos bancos de genes de diploides e tetraploides no melhoramento de hexaploides.
Atualmente, as técnicas de seleção podem alcançar os objetivos dos agricultores primitivos com muito mais certeza. Cultivares de alto rendimento devem a melhoria do seu desempenho ao aumento genético do número de antécios férteis nas espiguetas, do tamanho das espigas e do número de espigas por planta, o que, em grande parte, determina o índice de colheita, razão entre peso de grão e de palha. Mas o rendimento de grãos é também muito influenciado pela resistência das plantas a moléstias e pragas, e pela capacidade de aproveitamento do nitrogênio aplicado nas lavouras, de modo que os efeitos desses componentes são extremamente inter-relacionados.
Um grande avanço na produtividade do trigo foi alcançado nos anos 1960, a partir de um cruzamento realizado pelo melhorista americano Orville Vogel entre a cultivar norte-americana Brevor e uma cultivar japonesa anã sem importância econômica chamada Norin 10. O resultado foi a cultivar Gaines, lançada em escala comercial no ano de 1961 e largamente utilizada como genitor por melhoristas na Europa Ocidental (FELDMAN et al., 1995). A notícia sobre o trigo de Vogel também chegou ao Centro Internacional de Melhoramento de Milho e Trigo (Cimmyt), no México, onde Norman Borlaug trabalhava com trigo para obtenção de resistência a diferentes fungos. Borlaug levou sementes de Norin 10 e de híbridos de Norin-Brevor para o México e começou a fazer novos cruzamentos. Em poucos anos ele havia criado um trigo com rendimento de grãos três vezes maior que o anterior. Até 1963, 95% do trigo do México era composto pela variedade de Borlaug, e a safra do país foi seis vezes maior do que a existente até então (TRIGO..., 2006).
Em 1963, Borlaug foi visitar a Índia, que estava a um passo da fome em massa, e começou a testar três variedades de trigo mexicano. Os resultados foram quatro ou cinco vezes melhores do que os obtidos com as variedades indianas. Os agricultores indianos adotaram os trigos de Borlaug e obtiveram resultados impressionantes. Até 1974, a produção de trigo na Índia triplicou e o país tornou-se autossuficiente nessa cultura (TRIGO..., 2006). Em 1970, Borlaug recebeu o Prêmio Nobel da Paz por contribuir para a redução da fome por meio da Revolução Verde. Os trigos semianões tornaram-se as bases da Revolução Verde na Índia, no Paquistão, no Irã e na bacia do Mediterrâneo.
Embora a introdução dos trigos semianões tenha permitido que muitos países em desenvolvimento adquirissem autossuficiência na cultura, muitos produtores não tinham condições de fornecer as quantidades crescentes de adubo nitrogenado requeridas por esse tipo de trigo. Além disso, existia um limite para o aumento do rendimento por meio do incremento do índice de colheita. Melhoristas têm tentado desenvolver trigos altos com genes de nanismo, que combinem a capacidade de alto rendimento com a grande biomassa dos derivados de Norim 10. Apesar da natureza empírica de muitos desses trabalhos, no leste e no oeste da Europa, os rendimentos continuam aumentando. Parte desse aumento se deve ao melhor controle de moléstias e à redução nas perdas causadas por falha no aproveitamento do nitrogênio aplicado. Isso tem sido alcançado pelo melhoramento necessariamente combinado com o uso de agroquímicos (FELDMAN et al., 1995).
Na América do Sul, o melhoramento genético de trigo começou em 1912, quando o governo uruguaio contratou os pesquisadores alemães Alberto Boerger e Enrique Klein para darem início às atividades do primeiro Instituto de Pesquisa Agrícola do continente, La Estanzuela (ARIAS, 1999). Em 1924, o geneticista sueco Iwar Beckman veio para o Brasil e iniciou seus trabalhos na antiga Estação de Seleção de Sementes de Alfredo Chaves, no Município de Veranópolis, RS. No ano seguinte, realizou a primeira hibridação de trigo no Brasil (linhagem Alfredo Chaves x Polysu). Os genótipos oriundos desse cruzamento, entre os quais se destacou a cultivar Frontana, formaram a base para quase todas as atuais cultivares brasileiras. A Frontana, que reunia os caracteres de boa adaptação local, precocidade, porte intermediário e resistência à ferrugem-do-colmo, foi muito utilizada em programas de melhoramento no Brasil e no mundo. O enfoque dado por Beckman foi, para a época, totalmente revolucionário. O melhoramento de trigo era feito somente com genótipos de ciclo longo, e Beckman foi o precursor das cultivares precoces que se adaptavam à semeadura tardia. Mas sua preocupação não se restringiu ao ciclo das cultivares. Beckman conduziu seus trabalhos na busca de resistência a moléstias (como ferrugem-da-folha e ferrugem-do-colmo), tolerância ao crestamento (efeito da acidez do solo provocada por altos teores de alumínio e manganês) e qualidade nutricional do trigo (DEL DUCA, 1999).
Por ser originário de uma região muito distinta, o trigo tem exigido um esforço muito maior da pesquisa agronômica dos países do Hemisfério Sul, com exceção da Argentina, cujas condições de clima e solo são muito semelhantes às dos centros de origem. Nos agroecossistemas do Sul do Brasil, por exemplo, o trigo teve dificuldades especiais de adaptação. Os solos ácidos e as inúmeras moléstias fúngicas e pragas, além dos problemas climáticos na época de floração, limitaram a estabilidade e a confiabilidade dos rendimentos. Mas essas limitações, que se tornaram ainda mais graves com a monocultura, foram gradualmente superadas pela pesquisa, e hoje os trigos brasileiros são conhecidos por apresentarem os melhores genes, em patamar mundial, para tolerância à acidez de solo e resistência de planta adulta à ferrugem-da-folha e a outras doenças fúngicas (BAGGIO, 1999).
Outros caracteres que, nas últimas décadas, têm recebido maior atenção dos melhoristas de trigo são aqueles relacionados à qualidade do grão. Segundo Feldman et al. (1995), o aumento no rendimento de grãos está inevitavelmente associado ao menor conteúdo de proteína do grão e à baixa qualidade de panificação da farinha, apesar de procedimentos de fabricação terem sido desenvolvidos para produzir pães de forma satisfatória a partir de trigos com conteúdo de proteína relativamente baixo. Ainda assim, melhoristas estão convictos de que devem produzir cultivares com elevada qualidade de proteína de grão. Para isso, eles têm desenvolvido técnicas de eletroforese que possibilitam o acesso a pequenas amostras do grão – sem a destruição da semente – em estágios iniciais de um programa de melhoramento. Outras técnicas têm sido desenvolvidas para melhorar a eficiência de moagem do grão, que é a facilidade com que o pericarpo e a casca da semente podem ser separados do endosperma. Essas, porém, dificilmente poderiam ser aplicadas em um estágio inicial do ciclo do melhoramento.
A demanda por qualidade no mercado de trigo vem aumentando de forma contínua e acelerada nas últimas décadas, o que tem exigido de produtores, de agentes armazenadores e de indústrias de primeiro processamento não apenas a avaliação precisa da qualidade do trigo, mas também cuidados no pós-colheita e no armazenamento. A observância de atributos de segurança alimentar, como, por exemplo, a ausência de resíduos de pesticidas e de micotoxinas, tem sido uma medida indispensável para garantir um produto final de qualidade (MIRANDA et al., 2004).
O melhoramento genético do trigo baseava-se, até recentemente, apenas na avaliação da planta inteira, que envolve: a escolha de cultivares com caracteres genéticos desejáveis, para combiná-los por meio de cruzamentos artificiais; o cultivo de cinco a sete gerações descendentes, para seleção e purificação de plantas que apresentem as combinações procuradas; a avaliação da uniformidade genética (homozigose) das novas linhagens, para garantir a manutenção do perfil genético; e a organização de ensaios estatisticamente planejados, em vários agroecossistemas, para a seleção de linhagens superiores às cultivares em uso (BAGGIO, 1999).
Hoje, entretanto, como resultado dos investimentos públicos e privados feitos na pesquisa científica das últimas décadas os genomas de plantas já podem ser manipulados de formas antes inacessíveis ao homem. A disponibilidade de novas técnicas de manipulações celulares e moleculares tem melhorado muito a precisão que os melhoristas de plantas podem obter em seus trabalhos.
Técnicas como a cultura de anteras (estruturas que contêm os grãos de pólen) e os cruzamentos interespecíficos, empregadas para a obtenção de embriões haploides, surgiram com a perspectiva de superar uma das grandes limitações do melhoramento de plantas autógamas: o longo tempo necessário para que as linhagens selecionadas atinjam a homozigose. A haploidia permite acelerar o processo de melhoramento varietal pela eliminação das gerações segregantes heterozigotas. Por meio da técnica de cultura de anteras, é possível desenvolver um embrião haploide a partir do grão de pólen apenas (androgênese), sem que haja fertilização e formação de semente. Uma planta geneticamente homozigota pode ser gerada após a duplicação química do genoma com o alcaloide colchicina, dispensando a seleção e as inúmeras gerações necessárias no melhoramento convencional (BAGGIO, 1999). Atualmente, os cruzamentos interespecíficos, que logram a haploidia pela eliminação do genoma paterno, têm substituído a técnica de cultura de anteras por apresentarem resultados muito superiores (MORAES-FERNANDES et al., 2002). Em cruzamentos entre trigo e milho, o embrião híbrido perde rapidamente os cromossomos do milho (genitor paterno), mas permanece com os do trigo (genitor materno). Após o resgate e o cultivo do embrião haploide imaturo, obtém-se uma planta com apenas o genoma do genitor materno; por isso esse processo é conhecido como ginogênese. Essas técnicas têm permitido economia de tempo, de espaço e de mão de obra de seleção, tornando a avaliação do melhorista mais fácil e eficiente (BAGGIO, 1999).
Outra técnica que já trouxe resultados importantes para o melhoramento do trigo é a manipulação do sistema que controla o pareamento meiótico. Estudos já mostraram que esse sistema é complexo, havendo genes supressores e promotores da associação pré-meiótica. O conhecimento e a manipulação desse mecanismo permitem o controle da formação de quiasmas (pontos de contato entre cromátides não irmãs) em células de híbridos de espécies distantes, facilitando a translocação de segmentos cromossômicos portadores de caracteres desejáveis (MORAES-FERNANDES, 1985). Na Tabela 2 são apresentados alguns exemplos de caracteres introduzidos no trigo comum por meio dessa técnica.
Tabela 2. Caracteres introduzidos no trigo comum (T. aestivum) pela técnica de manipulação do sistema de controle do pareamento meiótico e espécies doadoras desses caracteres.
Fonte: Moraes-Fernandes (1985).
O rápido desenvolvimento tecnológico na área de marcadores moleculares abriu caminho para uma mudança no paradigma genético básico: inferência sobre o genótipo a partir do fenótipo (marcadores morfológicos). Essa mudança de enfoque foi denominada transição da genética mendeliana para a genética genômica (BECKMANN, 1988). Marcadores moleculares como os Restriction Fragment Length Polymorphisms (RFLPs) e Random Amplified Polymorphic DNA (RAPDs) têm aumentado muito a velocidade e a precisão com que os melhoristas localizam a posição de genes individuais nos cromossomos. Os genes são caracterizados por marcadores moleculares que podem ser usados em programas de melhoramento para identificar plantas que carregam genes desejáveis. O procedimento é particularmente útil na manipulação de genes de caracteres como resistência a moléstias, suscetibilidade do grão à germinação prematura ou qualidade do grão, os quais não podem ser manipulados convenientemente com base em uma única planta. Eles também podem ser usados para combinar o número de genes de resistência a uma moléstia para uma planta única, sem necessidade de uma complexa análise genética subsequente. Além disso, a técnica de RFLP pode ser usada na manipulação de caracteres fisiológicos quantitativos, como aqueles que determinam tamanho de espiga, rendimento ou até taxa de fotossíntese.
Por fim, o procedimento de transferência de DNA, também conhecido como transgenia, surge como uma nova etapa no processo de obtenção de variabilidade, uma vez que permite inserir, no genoma de um organismo receptor, por meio de técnicas de Engenharia Genética, um ou mais genes obtidos de indivíduos diferentes, que podem ser da mesma espécie do receptor ou de espécie não relacionada. Essas técnicas modernas de manipulação genética vêm sendo empregadas com relativo sucesso no melhoramento de plantas, principalmente sobre caracteres qualitativos. Entretanto, hoje as descobertas científicas não estão mais disponíveis gratuitamente. Diversas etapas do processo de transgenia estão patenteadas por empresas diferentes, o que torna burocrático e demorado o acesso à tecnologia completa por causa da necessidade de licenças (BAGGIO, 1999).
Contudo, as perspectivas de exploração de novos horizontes de conhecimento científico trazem, paralelamente, expectativas de maior retorno tecnológico à pesquisa para geração de novas cultivares. Essas técnicas, aliadas ao conhecimento da história evolutiva do trigo, permitem ampliar a manipulação da variabilidade disponível, o que possibilita aumento de produção e melhor adaptação às mais diversas condições ambientais, e traz contribuição significativa para a triticultura nacional e mundial.
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